quinta-feira, 9 de julho de 2015

Sobre as emoções

Lucas àquela altura do dia certamente contava com um nível de estresse muito alto. Tivera uma conversa muito séria com seu namorado (agora ex), João. Encurralou-o contra a parede e perguntou o quão disposto ele estava a fazer aquilo dar certo. Os esforços não deveria partir de apenas um dos lados.
Decidiu sentar-se numa pedra e esperar que suas pernas bambas voltassem ao normal. Lembrou-se de quando o conhecera. A sensação que João lhe passara era de que ele seria aquela rocha firme, dura e estável quando precisasse de apoio, mas tinha a sensação de não ser mole o suficiente para furar aquela rocha de tanto bater, e se preparou para o dia em que sairia magoado. Imaginou que a tática seria envolvê-lo, ao invés de bater. Via a si mesmo como a água, intenso e emocional, e dar um pouco de umidade à rocha que era João poderia ser uma boa coisa. Talvez, imaginou, da mesma forma que buscava alguém firme e estável como uma rocha, essa rocha poderia estar buscando alguém maleável o suficiente para que pudesse lhe inspirar e animar a vida. Não podia deixar de se culpar, o tempo todo, que tenha alimentado expectativas demais em relação a João. Ele não era bom com sentimentos, bem sabia, mas ainda assim esperou amolecer o coração da pedra. Não envolveu-o afinal, caiu no erro de tentar bater até furar. Quebrou a cabeça - e estilhaçou o coração.
Apesar de tudo, tinha a esperança de que, se fosse mais agressivo, poderia impulsionar o relacionamento e, numa tentativa de salvá-lo, disse que queria terminar. Gritou com o amado, jogou boas verdades na cara dele, disse o quanto esperava e o quanto estava frustrado. Lembrou dos sacrifícios que teve que fazer e os que João não se dispôs a fazer também. Se a água não bastou, o fogo poderia esquentá-lo, talvez?
Mas como lhe doeu - e as lágrimas irromperam nesse instante - em ver que ele não esboçou a surpresa ou a tristeza ou o desespero em seus olhos, e que esperava ver. Mais uma vez a expectativa levou à frustração.
O sol parecia não ter forças contra aquela camada de nuvens cinzentas e o fraco vento frio que batia. Sentado sobre aquela pedra e encharcado em suas lágrimas, foi atingido em cheio pela solidão.

quarta-feira, 6 de maio de 2015

Privatização da Saúde

Com a criação da EBSERH – Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, o Governo Federal propõe a salvação dos Hospitais Universitários (HUs) de todas as universidades federais do país após um estratégico esquema de desmonte e sucateamento dessas instituições. A lógica da privatização está inserida através da alta rotatividade de leitos, uma vez que quanto mais pessoas ocuparem os leitos em menos tempo, maior o repasse de dinheiro, aumento do número de procedimentos desnecessários em busca de soluções rápidas, a permissão da entrada de capital estrangeiro, financiamento de planos de saúde, patrocínio de empresas do complexo médico-industrial e indústria farmacêutica, a permissividade a contratos sem licitação. A EBSERH fere inclusive a autonomia universitária, pois a Universidade deixa de gerenciar o HU, passando para as mãos da empresa, fere a lei 8.142 que garante o controle social, ao remover do Conselho Consultivo composto por usuários o seu caráter deliberativo. A EBSERH vem sendo inclusive imposta de forma autoritária em várias universidades federais do país, como aconteceu na UFG. Aprendamos com os exemplos da UFRJ, UniRio e UFSC.
Não só nos HUs, a privatização não-clássica ganha espaço com a criação de OSs (Organizações Sociais) e OSCIPs (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) que passam a gerenciar os hospitais municipais e estaduais. Tudo isso afeta, além das/os estudantes que têm esses hospitais como cenários de prática (pois alguns deles possuem convênio com sua universidade), as pessoas mais interessadas em uma saúde pública e de qualidade: a/o usuária/o. Estudo do TCE-SP afirma que a taxa de mortalidade em hospitais geridos por essas empresas é 70% maior que os de administração direta.
Por uma saúde pública, de qualidade, 100% estatal e uma educação em saúde pautada pelo ensino da determinação social do processo saúde-doença.

terça-feira, 5 de maio de 2015

A construção social da orientação sexual e a tática de combate às opressões com base em uma estratégia socialista

Houve, em todas as fases da sociedade, uma divisão sexual do trabalho com o intuito de explorar uma classe para garantir privilégios a outra. A partir dessa divisão criou-se o binarismo de gênero, no qual institui-se: homens como sendo aquelas pessoas que possuem pênis, e mulheres, aquelas que possuem vagina. De modo a possibilitar que se reproduzisse essa divisão sexual no núcleo familiar, o qual se constitui como a célula da sociedade, onde primeiro se reproduzem a exploração e opressão que são, dessa forma, naturalizadas, criou-se ao mesmo tempo a heteronormatividade , pois, imagine, se mulheres realizam determinada tarefa, homens realizam outra, um casamento de homossexuais estaria defasado de determinada tarefa, ou então, pior: essas pessoas poderiam dividi-las igualmente! E aí não haveria exploração de um lado, privilégios de outro, e a sociedade não se sustentaria.
É importante problematizar o que determina o gênero e a orientação sexual das pessoas a partir de uma análise marxista, entendendo a dinâmica da luta de classes, e não cair numa análise conciliatória pós-moderna, pois, entendendo que orientação sexual e gênero não existem, são na verdade criados pelo sistema capitalista, sem o qual as pessoas tenderiam a ser bissexuais (como já dizia a psicanálise) e andróginas, é possível pensar melhor nossa tática de combate às opressões que vise uma estratégia socialista. Assim é possível derrubar o sistema capitalista, criador dessas contradições e classificações, e impediríamos a ascensão de um outro sistema que reproduza os mesmos preconceitos, como houve em todos os sistemas sociais, desde a pré-história.
Por muito tempo, o movimento LGBT pautou uma luta que considerava a orientação sexual como característica inata do indivíduo, enquanto o gênero é considerado construção social. Esta última oferece risco muito maior à manutenção do modelo social vigente e, por isso, as travestis e as pessoas transexuais são, de forma mais intensa e cruel, marginalizadas e excluídas, fato que se reflete na expectativa de tais pessoas ser de 32 anos. Surge daí a dificuldade de se entender que a orientação sexual é, da mesma forma que o gênero, uma construção social, pois o movimento LGBT, historicamente, foi protagonizado por homens gays, cis, brancos, de classe média que não estavam dispostos a abdicar de seus privilégios (enquanto homens, brancos e cis) na luta por conquista de direitos (enquanto gays). O argumento de que pensar a orientação sexual como construção social abre espaço para contra-argumentos e projetos de lei que afirmem que a orientação sexual pode ser readequada aos padrões e normas sociais esbarra ao se observar que não é possível "readequar" as pessoas trans.
No fim, chegamos a essa conclusão: as pessoas amam pessoas, e no futuro elas deixarão de se categorizar em gêneros e orientações sexuais, porque na verdade isso é uma criação e algo que lhe é imposto hoje. Contudo, não nos furtemos de problematizar as opressões, tendo real noção de que essas categorias ainda existem, a fim de que, empoderades, saibamos transformar as condições objetivas da realidade tendo a visão do socialismo no horizonte.

sexta-feira, 10 de abril de 2015

Sonho Real

Prédio enorme. Sem mobília. Branco. Frio. Vazio.
Escadas.
2º andar.
Olho pra baixo.
Há uma sala no térreo cheia, com fluxo grande de pessoas. São pacientes e médiques.
Eu quero ir lá.
Escadas.
Térreo.
Porta.
É uma sala de aula. Cadê o hospital que tava funcionando ali?
Não entendir.
Escadas.
2º andar.
Olho pra baixo.
O hospital continua lá, e me dá um desespero porque eu quero chegar logo lá. Mas não consigo.
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em 19.3.2015

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Antídoto envenenado

A névoa mais sombria é a que corre ao meio-dia. E ninguém vê.
Trafega entre os carros e os pés. Da multidão.
Sobe pelo encanamento pra dentro de casa.
Às vezes entra pelas frestas. Da alma.
Onde o amor esqueceu-se de chegar.
Névoa que afoga e envenena.
Mata e dilacera.
Sobe aos poucos pela espinha, apodrecendo a esperança.
Penetra os ossos. Ocupa o lugar do espírito.
Enganou-se quem acreditava na existência do vácuo; a névoa sombria, venenosa e maldita, ocupa o lugar do amor.
Pior. Ela vicia. Quem encontra o antídoto não quer usar. E não desce forçado.
O antídoto é o braço estendido, o vaga-lume na escuridão, pra quem está acorrentado e vendado.
Pela névoa mais sombria.
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7 de janeiro de 2015

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Na madrugada

A poesia nunca deve ser feita à caneta
Somente à lápis, devido à sua inconsistência,
Inconstância.
Amores de vida inteira que se acabam de repente.
Sem mais nem porque. Reviravolta.
E volta.
Conflituosidade
À medida que vai sendo feita
Descarrega no papel a alma do poeta.
A poesia é feita disso: de lápis, de
Amor - ou paixões,
Feita à base de alma
Na madrugada.

sexta-feira, 11 de julho de 2014

Fluxo do dar e receber

Estar com algumas pessoas simplesmente faz desabrochar em mim a poesia. Como posso eu também fazê-la desabrochar nos outros?
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Verso de ônibus, 10.7.2014.