“Todos os indivíduos são
igualmente capazes de alcançar o mesmo grau de educação? Imaginemos uma
sociedade organizada segundo a maneira mais igualitária possível e em que todas
as crianças tenham desde o nascimento o mesmo ponto de partida, tanto no plano econômico
e social como no político, ou seja, exatamente o mesmo cuidado, a mesma
educação, o mesmo ensino; não haverá entre estes milhares de pequenos
indivíduos diferenças infinitas de energia, de tendências naturais, de
aptidões?
Este é o grande argumento de
nossos adversários, burgueses puros e socialistas burgueses. Creem-no
irresistível. Tentemos, pois, provar o contrário. Em primeiro lugar, com que
direito se fundamentam no princípio das capacidades individuais? Há lugar para
o desenvolvimento destas capacidades na sociedade tal como é? Pode haver um
lugar para o desenvolvimento numa sociedade que continuará tendo como base
econômica o direito de herança? Evidentemente que não, pois desde o momento
em que houver herança, a carreira das crianças não será nunca o resultado de
suas capacidades e de sua energia individual; será antes de mais nada o do
estado de fortuna, da riqueza e da miséria de suas famílias. Os herdeiros
ricos, porém néscios, receberão um ensino superior, as crianças mais
inteligentes do proletariado continuarão recebendo como herança a ignorância,
exatamente como se pratica agora. Não é, pois, uma hipocrisia, um engano
infame, falar de direitos individuais fundados em capacidades individuais não
só na atual sociedade, mas também inclusive com vistas a uma sociedade
reformada, que não obstante continuaria tendo como base a propriedade
individual e o direito de herança?”.
- Aqui, Bakunin diz que as diferenças entre as pessoas é fortemente estabelecida de acordo com a classe social em que a criança nasce. Quer dizer, uma criança nascida em família abastada terá sempre muito mais possibilidades de carreira que aquela nascida no berço de ouro. As diferenças entre as pessoas existem principalmente porque existem diferentes classes sociais.
- Bakunin afirma que a expressão das diferenças intelectuais entre as pessoas deve-se principalmente às diferenças de instrução que cada uma recebe. A uns, uma educação que promova sua intelectualidade, e a outras, somente o necessário para que continuem em trabalhos braçais aos quais se nega a burguesia a realizá-los. Não são verdadeiros escravos os de baixa instrução? Como pode haver escravos que defendam esse regime escravocrata?
- Como você pode achar justo (diga-me: você acha realmente justo?) que, caso uma criança nascida rica queira ser o que se chama de “vagabundo” - ou seja, não dedicar-se a trabalhar em nada, dedicar-se somente a gastar o dinheiro de sua família - possa fazer isso, enquanto milhões de pessoas sofrem com a fome?
“Fala-se tanto de liberdade
individual hoje, e no entanto o que domina não é em absoluto o indivíduo
humano, o indivíduo considerado em geral, é o indivíduo privilegiado por sua
posição social, é por conseguinte a posição, a classe. Que se atreva um
indivíduo inteligente da burguesia a levantar-se contra os privilégios
econômicos desta classe respeitável, e veremos o quanto estes bons burgueses,
que neste momento só têm na boca a liberdade individual, respeitarão a sua. E
ainda se fala em capacidades individuais! Não vemos cada dia as maiores
capacidades operárias e burguesas
forçadas a dar passagem e inclusive abaixar a cabeça diante da estupidez dos
herdeiros do bezerro de ouro? A liberdade individual, não privilegiada mas
sim humana, as capacidades reais dos indivíduos só poderão realizar seu pleno
desenvolvimento em plena igualdade. Quando houver igualdade de ponto de
partida para todos os homens da terra, somente então se poderá dizer, com muito
mais razão que hoje, que todo indivíduo é filho de suas obras. Daí
concluirmos que, para que as capacidades individuais prosperem e não haja
impedimento quanto a dar frutos, é necessário antes de tudo que todos os privilégios individuais, tanto econômicos
como políticos, tenham desaparecido, isto é, que todas as classes sociais sejam
abolidas. É necessário o desaparecimento da propriedade individual e do direito
de herança, é necessário o triunfo econômico, político e social da igualdade.”
- Bakunin demonstra que não haverá verdadeira meritocracia em qualquer sociedade enquanto não houver igualdade para todos, igualdade que virá com o fim das classes sociais.
- Por que dividir as pessoas em classes se elas são todas iguais? O que as divide em classes sociais é o direito de herança e da propriedade individual, elementos que devem ser então abolidos da sociedade para que se possa dizer que há, enfim, meritocracia.
“Mas uma vez vitoriosa a
igualdade e bem estabelecida, não haverá mais nenhuma diferença entre as
capacidades e os graus de energia das pessoas? Sim; haverá, talvez não tanto
como hoje, mas sem dúvida sempre existirá. É uma verdade que se tornou
proverbial, e que provavelmente não deixará nunca de ser uma verdade: na mesma
árvore não há nunca duas folhas idênticas. Com muito mais razão, será sempre
verdade em relação aos homens, uma vez que estes são seres muito mais complexos
do que as folhas. Mas esta diversidade, longe de ser um mal, é ao contrário uma
riqueza do homem, como bem observou o filósofo alemão Feuerbach. Graças a
ela a humanidade forma um conjunto em que uns completam os outros e se
necessitam mutuamente e de tal modo que esta diversidade infinita dos
indivíduos humanos é a causa, a base
principal da solidariedade, um argumento bastante poderoso em favor da
igualdade.”
- Ou seja, justamente as diferenças entre as pessoas é o argumento mais forte a favor da igualdade entre elas (quer dizer, o fim da divisão das pessoas em classes sociais), pois todas precisam umas das outras. Daí advém a necessidade da solidariedade para que haja um mundo justo e igualitário. Não há justiça, solidariedade, igualdade, quando uns são superiores a outros apenas por causa da classe social em que nasceram.